quarta-feira, 5 de junho de 2019

Garimpo de ouro em minas de aluvião deixa rastro de poluição no rio Madeira

Poluição por metais tóxicos no maior afluente do rio Amazonas foi identificado em estudo de pesquisadores brasileiros e australianos

Apesar de ter entrado em declínio a partir de 1985, o garimpo de ouro em minas de aluvião nas margens e no leito do rio Madeira, no Estado do Amazonas, tem deixado um rastro de poluição por metais tóxicos no maior afluente do rio Amazonas.
Um estudo feito por pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Rio Claro, em parceria com colegas da Queensland University of Technology, da Austrália, encontrou um nível relativamente alto de mercúrio acumulado em sedimentos de lagos do rio Madeira – gerado pela extração artesanal de ouro.
Os resultados do trabalho, apoiado pela Fapesp no âmbito da modalidade São Paulo Researchers in International Collaboration (SPRINT), foram publicados na revista Ecotoxicology and Environmental Safety. O estudo tem a participação de pesquisadores da Universidade Federal de Rondônia (Unir) e da Shenzen University, na China.
“Embora tenha diminuído a intensidade da extração de ouro por mineração artesanal e de pequena escala no rio Madeira nas últimas duas décadas, essa atividade continua a ser a principal fonte de emissão de mercúrio que encontramos em sedimentos de lagos daquela bacia”, disse Daniel Marcos Bonotto, professor da Unesp de Rio Claro e primeiro autor do estudo, à Agência Fapesp.
O projeto é o segundo que Bonotto realiza com apoio do SPRINT da Fapesp. O primeiro foi em 2016, quando ele se associou a Trevor Elliot, professor da Queen’s University Belfast, da Irlanda, em um estudo sobre traçadores ambientais para a gestão de recursos hídricos.
“O SPRINT favorece a mobilidade e a identificação de projetos em colaboração com pesquisadores do exterior, mesmo que ainda não estejam formatados”, disse Bonotto.
Colaborações internacionais
A criação de novas parcerias em pesquisa é justamente um dos objetivos do SPRINT, modalidade que completa cinco anos. Lançada em abril de 2014, com o objetivo de promover o avanço da pesquisa científica por meio de colaborações entre pesquisadores vinculados a universidades e instituições de pesquisa no Estado de São Paulo e cientistas parceiros no exterior em projetos conjuntos de médio e longo prazo, essa estratégia de organização da Fapesp oferece financiamento para a fase inicial de colaborações internacionais em pesquisa – o chamado seed funding (financiamento semente).
“A expectativa da Fapesp é que o seed funding oferecido, somado aos recursos da universidade parceira, permita aos pesquisadores interagir em um projeto e, ao mesmo tempo, desenvolver uma colaboração que leve a uma proposta de pesquisa conjunta de médio ou longo prazo a ser submetida à Fundação e às agências estrangeiras acessíveis pelo pesquisador parceiro”, disse Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp.
Como explicou Marilda Solon Teixeira Bottesi, assessora para colaborações em pesquisa da Fapesp, os objetivos do SPRINT são consolidar parcerias de pesquisa já existentes ou estimular novas colaborações por meio do financiamento de missões científicas.
“Por meio dos projetos apoiados pelo SPRINT, os pesquisadores participantes têm a oportunidade de visitar as instituições e conhecer os laboratórios e as pesquisas conduzidas por seus parceiros e, com isso, propor projetos conjuntos”, disse.
A parceria de Bonotto com pesquisadores australianos, por exemplo, permitiu ampliar a investigação que o grupo dele na Unesp iniciou ainda na década de 1990, quando começaram a coletar sedimentos de diferentes profundidades e rochas circundantes de lagos do rio Madeira, em Porto Velho (RO), a fim de avaliar as concentrações e determinar as fontes de mercúrio.
O metal tóxico, que representa um risco para a saúde ao ser ingerido por meio do consumo de peixes, pode contaminar as águas do Madeira naturalmente ao ser transportado do solo para cursos de água, ou pelas emissões atmosféricas de erupções vulcânicas dos Andes. Além disso, também pode ser gerado pelo garimpo de ouro de aluvião, explicou Bonotto. “Chegamos a presenciar durante estudos em campo o descarte direto de mercúrio por garimpeiros em lagos do Madeira”, disse Bonotto.
A fim de estimar a contribuição de fontes naturais e do garimpo de ouro de aluvião para as concentrações de mercúrio encontradas em lagos do rio Madeira, os pesquisadores fizeram uma análise dos dados de sedimentos e de rochas de nove lagos, baseada em redes bayesianas.
Esses modelos gráficos, que representam de forma simples as relações de causalidade das variáveis de um sistema, têm sido usados para entender redes ambientais complexas, como para a predição de abundância de espécies em função de características de hábitat.
“Nossos colegas da Austrália, especialistas nessa abordagem estatística, acharam interessante tentar usá-la para avaliar a contribuição das diferentes fontes de emissão de mercúrio em lagos do rio Madeira com base nos dados de sedimentos que coletamos”, afirmou Bonotto.
Os resultados das análises indicaram que, embora as formações geológicas e do solo dos ecossistemas amazônicos influenciem o transporte de mercúrio nos lagos do rio Madeira, o garimpo de ouro de aluvião tem uma grande parcela de contribuição na geração do metal encontrado nessa bacia.
Os pesquisadores constataram que os sedimentos de fundo dos lagos apresentavam concentrações significativamente mais elevadas de mercúrio do que as rochas circundantes – o que afasta a hipótese dessas últimas serem a fonte de emissão do metal.
Uma vez que a mineração de ouro diminuiu significativamente na região nos últimos anos, as emissões anteriores de mercúrio por essa atividade contribuíram para as altas concentrações do metal encontradas nos sedimentos dos lagos, apontaram os autores do estudo.
“Normalmente, os sedimentos de fundo de lagos costumam reter muitas evidências de poluição. As colunas de sedimentos que coletamos, por exemplo, de diferentes profundidades, retêm registros de poluição por mercúrio de vários anos”, disse Bonotto.
Agora, em colaboração com os colegas australianos da Queensland University of Technology, Bonotto pretende usar a mesma abordagem estatística para estimar as fontes de emissão de cromo pela indústria de calçados de Franca em rios da região. “Também queremos avaliar a influência de nitrato no transporte de urânio em águas subterrâneas do aquífero Guarani, no Estado de São Paulo”, disse Bonotto.
O SPRINT tem quatro chamadas por ano. As propostas devem ser apresentadas sempre até a última segunda-feira dos meses de janeiro, abril, julho e outubro. A primeira chamada deste ano, com prazo final para envio de propostas até 29 de abril, bateu o recorde de instituições participantes. São 16 instituições de diversos países.
O SPRINT já apoiou mais de cem projetos de pesquisa realizados por pesquisadores vinculados a universidades públicas e privadas e a instituições de pesquisa sediadas no Estado de São Paulo em colaboração com cientistas da Inglaterra, Estados Unidos, Austrália, França, Holanda, Canadá, Irlanda, Irã, Argentina, Espanha, África do Sul, País de Gales, Escócia, Alemanha, Bélgica, China, Suécia, Chile, Japão e Dinamarca.

sexta-feira, 10 de maio de 2019

MPF- AM pede bloqueio de R$ 47,3 milhões.
ação civil pública contra a empresa Amata S/A e seus sócios-administradores por ter provocado graves danos ambientais à floresta amazônica brasileira. A empresa foi um dos alvos dos mandados de busca e apreensão cumpridos durante segunda fase da operação ‘’Arquimedes’’ I, deflagrada no último dia 25 de abril.
O MPF-AM pede o bloqueio imediato de R$ 47,3 milhões em bens e valores da empresa e seus sócios, e também R$ 10 milhões por danos morais coletivos.
Perícias realizadas durante a primeira fase da operação “Arquimedes”, deflagrada pela Polícia Federal (PF) no fim de abril, mostrou o envolvimento da empresa com a exploração ilegal de madeira.
Por isso, o MPF pede a suspensão ou perda de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo poder público à Amata S/A, seus sócios e a declaração de proibição de participação em linhas financiamento de créditos, até que seja iniciado a recuperação dos danos ambientais causadas pelas práticas ilegais provadas durante a investigação.
Está em análise, também, o pedido de revisão do certificado internacional que a empresa tinha, concedido pelo Conselho Brasileiro de Manejo Florestal (FSC, na sigla em inglês), o que lhe conferia ‘’certa vantagem’’ e ‘’credibilidade’’ no exigente mercado europeu e norte-americano.
De acordo com o procurador da República, Leonardo Galiano, que assina a ação, as investigações revelaram que cinco dos 140 contêineres destinados à exportação para países da Europa, Ásia e América do Norte, com selo de manejo florestal sustentável (um requisito indispensável no mercado internacional), tinha origem, na realidade, em fraudes que vão desde o manejo até o transporte desses produtos naturais.
‘’Esse esquema ilegal resultou em graves danos ao meio ambiente e prejuízos significativos ao patrimônio público que necessitam ser compensados. O que houve, na verdade, foi uma transferência ilegal de créditos de madeira, ou seja, a empresa emitia o DOF (Documento de Origem Florestal), contudo, cancelava o documento para extrair mais madeira usando o mesmo crédito’’, explicou.
Há na ação civil, ainda, pedido para que a Justiça determine que parte dessa madeira enviada ilegalmente para o exterior seja repatriada após cooperação internacional com autoridades estrangeiras.
As divergências entre a carga apreendida e a descrição da autorização verificada durante as investigações iniciais da PF foram fundamentais para trazer à tona o esquema ilegal que envolvia madeireiros, engenheiros florestais, técnicos e servidores públicos do Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
A operação “Arquimedes” expôs a necessidade de reestruturação e modernização dos órgãos ambientais. Como ressaltou o delegado da PF, Max Alves, “a operação está permitindo que os órgãos alterem o seus processos de fiscalização até mesmo para que seus servidores estejam menos sujeitos à corrupção”.
Em nota, a Amata disse que "é um equívoco" a companhia estar entre as investigadas na operação. "Estamos seguros de que esse equívoco será esclarecido ao longo da apuração dos fatos", disse a empresa. Ainda no comunicado, a Amata afirmou ser apoiadora das investigações. "Operações como a Arquimedes, deflagrada no último dia 25 de abril pela Polícia Federal, fazem parte de um esforço necessário para controlar o desmatamento e a exploração ilegal de madeira no Brasil".
Investigações continuam
A PF tem atuado em duas frentes de investigação criminal por meio de dois inquéritos policiais: a primeira, sobre a extração, exploração e comércio ilegais de madeira, e a segunda sobre a corrupção entre servidores de órgão ambiental estadual, engenheiros ambientais, detentores de planos de manejo e proprietários de empresas madeireiras.
Até agora foram expedidos 23 mandados de prisão preventiva, seis de prisão temporária, 109 mandados de busca e apreensão cumpridos nos estados do Amazonas, Acre, Paraná, Mato Grosso, Minas Gerais, Rondônia, Roraima, São Paulo e Distrito Federal.
Como lembrou o procurador da República, Leonardo Galiano, “a ação civil pública apresentada à Justiça não esgota as repercussões cíveis, criminais e administrativas que ainda podem ser adotadas pelo MPF para responsabilizar os envolvidos”.
A ação tramita na 7° Vara Federal do Amazonas e aguarda decisão da Justiça em relação aos pedidos de decisão liminar.